Crônica – “NO MEU TEMPO É QUE ERA BOM”
“NO MEU TEMPO É QUE ERA BOM”
A infância que eu tive, na recém emancipada Paim Filho, lá nos longínquos anos 60 e 70, foi de uma simplicidade que só percebi muitos anos depois, quando pude comparar com o mesmo período vivenciado pelas minhas filhas.
A cidade ainda engatinhava em sua pretensa autonomia, com suas ruas de chão batido sendo muito lentamente recobertas por calçamento e ainda percorridas por carroças e cavalos, além de alguns raros Fuscas, Jipes, Kombis e caminhonetes.
Íamos para a aula com roupas e calçados baratos. O “guarda-pó” branco quase sempre retornava marrom para nossas mães, rendendo xingamentos e até uma ou outra surra de vara, dependendo do estado em que deixávamos aquela peça de roupa, que às vezes era única e precisava ser lavada, secada e passada para o dia seguinte. Mas não era opção não sair da aula e ir jogar bola ou “nica” na casa de algum amigo.
Interessante é que ninguém de nós se dava conta de que nossos pais eram pobres, pois parecíamos todos iguais. Ninguém tinha brinquedos, roupas ou calçados muito fora do padrão. Os mais “ricos” da turma eram o filho do prefeito, o filho do advogado, a filha do médico…mas, mesmo eles, tinham a mesma vida simples e viviam exatamente como nós. Bastava que alguém tivesse uma “bola de capão” para nos divertirmos nos campinhos de goleiras feitas com forquilhas de timbó, ou que tivéssemos meia-dúzia de bolinhas de gude no bolso, para nos desafiarmos mutuamente em saborosos embates, diante de “bucos” escavados com o calcanhar na terra vermelha enlameada.
No verão escaldante, a escolha era pescar no rio Forquilha. De manhã ou de tarde, dependendo do turno da aula. E como dava Lambari… Descíamos até o porto da balsa e nos ajeitávamos na beirada dos barrancos com nossos “caniços” e linhas de golpe. Ao nosso lado, minhocas em uma latinha velha de massa-de-tomate, ou uma massa feita com farinha de milho e de trigo, que transformávamos em pequenas bolinhas para prender na ponta do anzol. E com essas iscas, enchíamos varas de lambaris. Às vezes levávamos para casa e dávamos às nossas mães uma opção de almoço a mais – polenta com lambari frito era uma iguaria saboreada rotineiramente. Outras vezes levávamos o produto de nossa pescaria para os bares da cidade, onde vendíamos a produção do dia. Era costume o dono do bar servir um aperitivo de lambari frito bem sequinho aos homens que costumavam tomar seu “martelinho” antes do almoço ou ao final do dia. Assim, conseguíamos algumas moedas para gastar nos dias seguintes com picolés e outras guloseimas. Era muito divertida essa rotina de verão.
E não dá prá deixar de fora as nossas caçadas com “bodoque”.
Esse era outro divertimento que não encontro comparação nos dias de hoje, com as crianças acostumadas aos seus jogos eletrônicos e brinquedos que brincam sozinhos. Jamais saberão o gostinho de sair com a “arma” pendurada no pescoço e os bolsos cheios de pequenas pedrinhas, previamente selecionadas por peso e formato, na tentativa de caçar encher de pequenos passarinhos o “bocó” que levávamos a tiracolo. Até porque hoje é impensável sair por aí matando passarinhos . No meu caso, voltava sempre de mãos abanando. Sempre fui muito ruim de mira e mesmo após anos de insistência, sério, não lembro de ter acertado alguma ave…ainda bem, digo hoje.
Enfim, o fato é que a simplicidade daqueles tempos deu lugar a uma vida mais sofisticada, com novos costumes, com mais acesso a bens materiais e com um novo jeito de viver a infância, hoje muito mais “urbana” e com menos contato com a natureza.
Então, “no meu tempo era melhor” ???
Creio que nem melhor, nem pior. Era diferente. E assim será a infância das próximas gerações. Diferente da minha, diferente da infância de nossos filhos e netos. Faz parte da evolução humana. Mas que dá uma saudade… isso dá…
Marco Antônio S. Arsego
20/01/2023
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