CRÔNICA – A ÚLTIMA FLOR DO LÁCIO
A ÚLTIMA FLOR DO LÁCIO
A língua portuguesa é considerada a última das filhas do latim. Os estudos linguísticos apontam que teria se originado do latim vulgar, que era falado pelos soldados romanos, camponeses e camadas populares, na região italiana do Lácio, um triângulo de solo vulcânico fértil onde Roma foi edificada.
Nenhuma língua jamais surge ou se forma por imposição.
Ao contrário, determinada forma de falar só é reconhecida como uma nova linguagem a partir do momento em que se constata que parcela muito significativa de uma população dela se utiliza para comunicar-se entre si, chamando a atenção dos linguistas, que passarão a considerá-la, por sua relevância, como uma nova língua.
Esse processo pode demorar séculos. Ao longo do tempo, as transformações verbais vão acontecendo de diversas maneiras, seja pela incorporação de vocábulos estrangeiros, seja por mudanças de pronúncia, seja pelo acréscimo ou subtração de sufixos durante a articulação dos vocábulos.
Não obstante, a própria incorporação de novos vocábulos, novas terminações ou mesmo novas formas de conjugar verbos ou aplicar pronomes, depende primeiramente de tais expressões serem aceitas pelo grande grupo e passarem a ser corriqueiramente utilizadas. Muito tempo depois, caso isso aconteça, é que tais vocábulos inovadores poderão ser reconhecidos e figurar nos dicionários. O mais famoso, no caso brasileiro, é o “Dicionário Aurélio”, que parece ser o divisor de águas no que tange à incorporação de novas formas na língua portuguesa. Quando figurar no Aurélio, passa-se a aceitar como válida a nova palavra.
Assim, soa incompreensível a tentativa de alguns grupos em tentar impor à sociedade em geral, situações que nada tem a ver com o português oficial (e, sim, existem normativos internacionais para seu uso, nos vários países onde a língua portuguesa é o idioma oficial).
O uso da língua oficial nada tem a ver com discussões de gênero e jamais poderia ser considerado preconceito com tais grupos a não utilização das formas linguísticas a eles restritas e ainda não popularizadas. Não há como querer que isso ocorra por imposição, tentando transformar em preconceituoso aquele que simplesmente faz uso correto da linguagem tal como usada de forma corriqueira e popular no momento. Num futuro próximo, se tais formas de expressão acabarem caindo no gosto da população e passarem a ser utilizadas de forma natural, certamente passarão a integrar nosso universo de palavras e serão reconhecidas como tal.
Para exemplificar, vou citar a tentativa dos grupos LGBTQIA+ de forçar o uso da conjugação TODES. Ora, esse vocábulo não existe no português. A forma “TODO” funciona normalmente como pronome indefinido e, como sabemos, pronomes podem variar (todo, toda, todos, todas). Daí depreende-se que seu uso abrange literalmente tudo – masculino, feminino ou neutro. Da mesma maneira que não tem sentido usar a forma “…a todos e a todas…” . Trata-se de uma desnecessária redundância e não sei de onde se tirou que seria preconceito contra as mulheres a não utilização dessa deturpação linguística. Antes, usar apenas “TODOS” para referir-se a uma platéia formada por homens e mulheres (ou quem não queira se encaixar em nenhum dos gêneros), trata-se, tão somente, da aplicação de uma palavra existente em nossa “flor do Lácio”, derivada do latim, que exprime a idéia de conjunto. E nesse conjunto pode estar qualquer forma – masculina, feminina, neutra, ou qualquer coisa que se queira. Simples assim. É a nossa língua portuguesa.
Portanto, por mais que se tente forçar o uso de qualquer expressão que seja, não há como primeiro inseri-la no dicionário para depois “obrigar” o povo a utilizá-la, seja via decreto ou por tentativa de imposição de determinados grupos ou “tribos”, com a mídia servindo de veículo de convencimento. O processo é exatamente o contrário. Um novo vocábulo ou expressão só será reconhecido, e só irá figurar no dicionário oficial (e ser incorporado ao nosso vocabulário) se seu uso se tornar suficientemente relevante dentro da comunicação de significativa parcela da população.
Na verdade, a linguagem falada está em constante evolução e a cada edição de nossos dicionários oficiais, novas expressões e palavras são incorporadas. Mas nossa bela “última Flor do Lácio” não pode e não deve sucumbir a desejos de minorias barulhentas, mesmo que sejam elas dignas de todo respeito e consideração. Simplesmente porque não é assim que funciona.
Autor: MARCO ANTÔNIO SCHNEIDER ARSEGO